O amor chega como quem nada quer.
Sorrateiro, lhe agarra. De surpresa, rouba o seu corpo; entra pela boca; pelo
nariz; pelos ouvidos; às vezes pelos poros; toma conta da cabeça e do coração;
faz suar as mãos; e embrulha o estômago. Faz ali uma cidade sitiada com o mais
forte dos muros, com o mais potente dos exércitos. Ou você cede, ou você luta,
mas sabendo que é guerra perdida. O amor não lhe dá escolhas, ele é! Ele está
onde quiser estar. Ele é dono do que quiser ter. Mesmo de você, o mais
independente dos homens. Mesmo de você, que é o mais insubordinado entre os viventes.
O amor lhe tem. Você se torna escravo. Mas essa escravidão pode ser tão boa,
quando o amor toma de assalto o outro também. Essa sensação de duas pessoas
serem capturadas e conectadas pelo amor é sublime. Então não tem por que lutar.
Só aproveitar. Se entregar. Viver sorrindo à toa. Sentindo saudades em cada
minuto que separa a hora da despedida do momento do reencontro. Pegar desesperado
o ônibus no fim do expediente para chegar em casa e desfrutar dos braços. Ficar
perdido em abraços. Unir os corpos e se tornar um só. Invadir um ao outro com
ferocidade. Encontrar o ápice. E depois relaxar. Sentindo a paz que esse mesmo
amor te traz.
Mas, às vezes, o amor é faceiro.
Parece querer rir às nossas custas. Ele volta os seus olhos para alguém. E,
propositalmente, esquece de voltar os olhos desse alguém para você. Aí é amor
de uma pessoa só. Amor de uma pessoa só dói. Os seus olhares não são
correspondidos. Não há sorrisos em troca dos seus. Não há braços para conter a
infinidade de abraços apertados que você tanto deseja. Não há beijos. Não há
desejo. Não há um “eu te amo”. Não há promessas de uma vida inteira.
Às vezes, o amor até pega o outro
também. Mas o abandona no meio do caminho. Abortando todos os planos
construídos em conjunto. Esse tipo, então, não só dói. Destrói!
Pelo menos, chega um momento que
ele vai embora e lhe dá um sossego. Permite que você levante da cama, escove os
dentes, faça a barba, tome um banho, vista uma boa roupa e reconstrua a sua
autoestima. Ele até permite que você aprenda alguma coisa. Que fique mais
forte. Às vezes, até imune a algumas ciladas. No fim de tudo, ele acaba valendo
a pena. Sempre vale a pena.