segunda-feira, 16 de setembro de 2013

A noite passada

  Sentiu em seu pescoço um ar quente e percebeu o corpo entrelaçado. Assim acordou e se deu conta de que havia braços a segurar-lhe a o tronco por ambos os lados. Suou frio por um momento. Com medo de acordar quem quer que estivesse lhe abraçando, permaneceu imóvel. Olhou a parede a sua frente. Era azul e tinha um mural de fotografias coladas de forma irregular. Sim, era seu quarto. Mas quem estava deitado em sua cama? Tentou se lembrar da noite que acabara de passar. Nada em sua cabeça. Olhou para a mão do indivíduo. Eram grandes, brancas e com pelos ralos. Não reconheceu. Pensou, então, em virar o corpo bem devagar. Tentou, mas abortou a ação, pois, com o movimento, os braços lhe envolveram com mais força. Não conseguiria sair dali.
     A noite passada era um mistério. Como não se lembrava dos acontecimentos? Era sábado e sabia que chegara do trabalho às 19h30 na sexta-feira. Não houve happy-hour, disso tinha certeza. A bebida não era o motivo de sua amnésia. Refez então os passos com o esforço da mente: "Cheguei ao prédio, cumprimentei Seu João da portaria, chamei o elevador que estava no 10º andar. O elevador chegou, eu entrei, apertei o número 11 e subi. Saí no meu andar, andei até a entrada do apartamento, coloquei a chave na fechadura, destranquei a porta, abri e... e..." Não se lembrou de nada a partir dali.
     Descontente, lhe passava pela mente várias e inimagináveis possibilidades de acontecimentos daquela noite. Sem lembrar-se de nada, não poderia dizer se fizera algo bom ou se enlouquecera totalmente. E se enlouqueceu? As pessoas viram? Será que tinham alguma prova contra? Temeu ainda mais. Decidiu que ficaria ali para sempre, trancado no apartamento, deitado naquela cama, envolto por aqueles braços.
    Em meio a todo medo, se deu conta de que os possíveis problemas eram secundários. Nesse momento precisava descobrir com quem havia dormido. Com frio na barriga, decidiu, finalmente, virar o rosto e vislumbrar o seu companheiro de sono. Moveu-se vagarosamente com um movimento que parecia nunca terminar. Quando conseguiu deitar sobre suas costas, "Bom dia!", disse uma voz próxima ao seu ouvido. Os seus olhos pareciam querer saltar do globo ocular. Todas as lembranças apareceram de repente. Não queria acreditar nos flashbacks, não, não podia.  Depois dos longos trinta minutos sem qualquer indício dos fatos, agora tinha uma certeza: Nada daquilo deveria ter acontecido.

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